29 agosto 2009

OS SOPRANOS - 86 Episódios depois lá acabou o meu visionamento da série e ela não me desiludiu.



Com temporadas mais bem conseguidas e alguns episódios marcantes pelo meio fez-se história com esta série.

No fundo, o verdadeiro conteúdo da série é a actual falta de valores tradicionais na sociedade, até mesmo no crime organizado. A comparação entre um passado rígido e disciplinado e um presente e futuro incerto e leviano é o grande tema em constante debate, seja na família pessoal e disfuncional de Tony ou na também disfuncional família mafiosa, e Tony é o foco central de todos esses conflitos, pois ele próprio, com a sua ambição, não tem problemas em achar que o mundo está todo virado ao contrário e já não existem valores como os que ele defende, como também não tem problemas em contornar esses mesmos valores para proveito próprio.

Acho engraçado que foi este conflito entre passado e presente que deu o verdadeiro “clic” à série. Foi no episódio em que Tony confrontou o seu Tio Júnior com uma piada nada inocente sobre o Tio fazer minetes (coisa proibida no passado para um Chefe, apesar de todos o fazerem) que despoletou toda uma série de acontecimentos, chegando o próprio uso da terapia, tão banal hoje em dia, ser visto como uma modernice para ajudar à primeira grande conspiração da série – a morte de Tony a mando da sua mãe Olívia e do seu Tio Júnior.

Não funcionou a primeira tentativa. Não funcionou nenhuma tentativa para derrubar Tony. Mas funcionou todo o grande plano de Tony. Para isso, muito contribuíram as personagens pontuais ao longo de cada temporada.

O Big Pussy deu muito sal à segunda temporada até os principais capos admitirem a eles próprios o que estava à frente dos seus olhos – Pussy traiu os valores e tornou-se um “rato” e tinha que ser abatido. O Richie Aprile foi outra grande estrela e foi a primeira grande ameaça vinda do passado após o retiro forçado do tio Júnior para os confins do seu lar, para além de dar um novo grande dinamismo à Janice, irmã e quase alma gémea de Tony, pois à sua maneira, ela é idêntica a pensar com Tony. O Ralph Cifaretto foi outra estrela nesta constelação e também ele deu dinamismo a Janice, para além de ser a personagem mais doida de toda a série, e consequentemente, depois de uma piada dirigida a Ginny Sacramoni a sua queda iniciou (apesar de o grande final para Ralph escreveu-se com a morte do cavalo Pie-Oh-Mie). Depois, foi Johnny Sacramoni a aparecer e a dar cartas, ameaçando o poder de Tony, mas como em toda a série, na hora H tudo corria a favor de Tony, e Sacramoni apesar de ter sorte com a sua sucessão a Carmine Lupertazzi, foi preso na altura tremida da entrada de muito dinheiro. Isso trouxe à cena o grande conflito entre Tony B, primo de Tony, e Phil Leotardo, e no fim isso quase levou à desgraça de Tony, apesar de ele próprio ter morto o primo. De resto, foi Tony a matar as grandes personagens de cada temporada (não matou a mãe, mas tentou), tirando Vito Spatafore que foi morto pelo Phil Leotardo, porque gays não têm lugar na máfia (apesar de Tony nesse momento até se mostrar liberal, bem, Vito era quem gerava mais dinheiro sejamos sinceros).

Ao longo da série existiram personagens marcantes e constantes. Moltisanti foi o pequeno sucessor sempre. Falhou em momentos cruciais, muito por culpa da droga e da sua relação com Adriana La Cerva, e o amor por Tony converteu-se em ódio mascarado de respeito. Sílvio Dante foi o consiglieri ao longo da série mas sempre primou por ser uma personagem muito linear e pouco desenvolvida. Paulie Gualtieri foi para mim a grande surpresa, pois apesar de enervar Tony até ao limite (o facto de representar o passado repugnava Tony), não foi liquidado e acabou por assumir o papel de destaque na família justamente no último episódio. Artie Bucco, que sempre primou por ser verdadeiro para com Tony, apesar de ser um cobardola, foi outro que se safou sem saber como ler ou escrever. Já Bobby Bacala, foi uma surpresa pela positiva, por deixar de ser um cuninhas e ao aliar-se em sagrado matrimónio com Janice, tornou-se no único a subir e bem na hierarquia, e no único a dar uma grande sova a Tony.

A família mafiosa era cheia de intrigas e personagens complexas, mas a família nuclear de Tony era igual. A mulher Carmela era, quer queiramos quer não, a reencarnação da mãe de Tony, pois sabia enervar Tony como ninguém sem nunca dar um grande passo a frente (tentou o divórcio mas por trocos voltou). Era a reencarnação e provou isso com o filho A.J., pois o rapaz ficou com os mesmos complexos que Tony, só não deu em macho alpha como Tony porque não calhou e Tony não deixou. Meadow, por sua vez, é o reflexo de Carmela, abdicando constantemente da sua vida em prol dos seus namorados, como havia feito a mãe, para além de ter uma atracção por homens parecidos com o pai e do mesmo ramo (sendo Finn a excepção à regra, e isso não durou). Olívia morreu mas deixou a marca na vida de Tony e no fim do dia a culpa era sempre dela. O tio Júnior, coitado, foi um incapaz, tal como fora com o pai de Tony, não conseguiu tomar o poder e a ruína caiu sobre.

A personagem que ficou de fora deste mundo foi Jennifer Melfi, que tentou lidar com Tony muito tempo e sem grandes progressos, vendo que foi usada ao longo desse tempo todo no fim.

Não vou dizer que não teve erros, sendo o episódio final a marca de uma falha, pois quando Tony visitou o Tio e depois virou costas, o ciclo fechou e a série também, mas foi decidido incluir mais 2 minutos muito controversos, mas…

Foi uma grande série, cheia de personagens marcantes, cheia de intrigas, cheia de momentos únicos. Acompanhou-me durante muitos meses e foi mesmo genial. Um marco da televisão a ver e rever, e pensar um pouco na nossa sociedade.

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