Quando me pediram para escrever um texto sobre o meu percurso
profissional e como este percurso se enquadrava na actual conjuntura do país, a
resposta foi logo “Sim. Sem problema”.
Contudo, depois pensei o que é que poderia escrever que não fosse uma infeliz
mas completa banalidade, perante os dias em que vivemos.
Dizer que sou da geração mais qualificada que este país teve a
capacidade (intelectual e financeira) de formar? Dizer que sou da geração cujos
sonhos e expectativas foram colocados nos píncaros (não só devido ao constante
crescimento do país como das suas oportunidades)? Dizer que sou da geração onde
os instrumentos de comunicação são tão abrangentes e universais que o mundo é a
minha nova casa?
Isso já todos nós sabemos. Como sabemos que tais constatações, pouco ou
nada, tiveram de impacto na forma mais tradicional de se obter emprego em
Portugal.
Infelizmente o que não sabemos é que existe algo em muitos de nós, da
nossa geração, que é muito mais forte do que o dinheiro, a ambição profissional
ou os títulos académicos honoríficos.
Existe uma extrema convicção de agradecimento. Um enorme sentido de
pertença. Um especial sentimento de ser português.
Portugal deu-me família e amigos. Deu-me ruas e locais. Deu-me memórias
tristes e alegres. Deu-me a oportunidade de estudar. E deu-me a capacidade para
trabalhar.
Sim. Não sendo dado a religiosíssimos ou espiritualismos, devo confessar
que sou dado a uma verdade universal – quem me fez bem, merece o meu respeito
e, pelo menos, a tentativa de retribuir.
E é por isso que, mesmo estudando com atenção a evolução da crise
financeira de 2008 para a actual crise económica…
Mesmo sabendo que um novo paradigma de ordem mundial estava para surgir…
Mesmo sabendo que a competência de todos os políticos juntos para
compreender e antecipar concertadamente planos de contenção para os males que
surgiriam a curto-prazo era zero e teriam consequências nefastas a médio e
longo prazo (pois em 38 anos de democracia, ainda não encontrámos uma geração
de políticos capazes - e como as juventudes partidárias estão formatadas
segundo a geração que as antecede, não podemos esperar uma boa geração nos
próximos tempos) …
Optei por deixar enganar-me pelo coração (quando a minha cabeça já
alertava para estas dificuldades há muito tempo) e acreditar que era possível
prosperar em Portugal apenas com as minhas capacidades.
Daí, este texto nada mais é de que uma enorme “mea culpa” por ser
ingénuo e honesto num país onde só prospera verdadeiramente quem tem a
fantástica capacidade de passar entre as pingas da
chuva devido à acefalia do seu carácter.
Não me
entendam mal. Se um dia estiver extremamente necessitado, também eu terei que
moldar o meu pensamento e sentido de honra, adaptando-me aos actuais meios de
obter remunerações condignas.
Mas também
não me entendam muito mal. Nesse dia, parte de mim morrerá. Será a parte em que
estou agradecido a Portugal por me ter dado ferramentas e não igualdade de
oportunidades.
Mas também
não me entendam extremamente mal. Em vez de vender a minha alma, comprarei uma
passagem de avião.
Daí (num
aparte), olhando para o fluxo migratório dos nossos jovens, vejo que emigram, e
apesar de abandonarem o país, são os melhores portugueses, porque aguentaram
até ao momento em que o futuro era hoje e os sonhos não se realizariam no país
que amavam. Pois, para muitos deles, tal como eu, os estudos também criaram a
ideia de liberdade, igualdade, fraternidade.
A estes só
umas palavras simples: mesmo que a vontade de voltar aperte muito no vosso
coração, não se esqueçam que se for para voltarem para um trabalho cujo
principal perfil seja subserviência, então não voltem, pois só mais destruído e
infeliz ficará o país e a vossa alma. Se for para voltar porque acreditam e
sabem que vão ser respeitados como profissionais íntegros e capazes, então
voltem e redescubram a alma, a raça e a vontade de vingar como portugueses.
Falando de
mim, pois era esse o objectivo e o devaneio já passou...
Como sugeri
nas linhas acima, acredito nas minhas capacidades.
Sei que sou
um excelente profissional na minha área, ou todos os empregos por onde passei
não tivessem sido executados com a maior da qualidade e profissionalismo
(muitas vezes executados de forma muito melhor do as que pessoas com imensos
anos de casa e proporcional ordenado – talvez daí não ter ficado mais do que o
contrato previa, porque deve ser mais incómodo trabalhar com alguém capaz ao
lado, do que um coitadinho que espirra graxa de sapato por cada acção que faz,
mandatado pelo partido A ou B).
Sei que tenho
espírito, ética e integridade fortes (ou não estaria aqui a escrever isto com
perfeita consciência e medindo as palavras a utilizar).
Sei que
preparei-me financeiramente, enquanto trabalhei, para uma travessia no deserto durante
algum tempo, neste país que amo.
Sei que se
tiver de começar do zero no mundo laboral, desde que tal não afecte a minha
integridade, não me importo de começar como estagiário, recibos verdes, ordenado
mínimo, como trolha, cortador de relvas, técnico ou sei lá o quê.
Mas sei… Sei
muito bem… Sei também como ninguém que… Se a humildade da minha parte em
refazer-me como profissional para adaptar-me à competitividade do mercado
laboral actual (coisa que dava pano para mangas como tópico de discussão, visto
que considero não ser uma boa solução a médio-prazo a contínua desvalorização
das remunerações do trabalho e os vínculos precários) não for proporcional à
mudança que este país precisa a curto-prazo, e voltar a ver os mesmos casos, de
pessoas incapazes e moralmente abomináveis a dividirem entre os seus contactos,
os empregos destinados aos mais capazes da minha geração…
Sei que tenho
guardado para o fim, uns euros para viajar numa low-cost e oferecer tudo que
tenho por quem aposte em mim (e, sem ser futurologista, tenho quase a certeza
que o meu “saco vai encher” e esse dinheiro será utilizado, visto Portugal ser
um país de brandos costumes) …
E, quando
esse dia chegar… Quem ficar por cá a destruir o capital humano fantástico que a
democracia trouxe… que arranje outro cortador de “relvas”, outro tocador de “cavaqu”inho,
outro caçador de “coelho”s, outro agente de “seguro”s…
Barcelos,
2012-10-30
Magno
Alexandre Neiva
P.S.: Mas se
é para a sociedade civil acordar, também convém reavaliar se será pertinente
manter o “Secret Story” como líder de audiências e não programas de informação.
E, já agora, se esses programas de dita informação, também não possuem agendas
escondidas…
Talvez o
melhor seja mesmo as pessoas começarem a refugiarem-se de volta aos grandes
livros de pensamento económico, social, político e filosófico. Afinal de
contas, se somos a geração mais instruída, temos a obrigação de aprender com os
clássicos do passado, em vez de acreditar no que um comentador comenta e no que
um político diz… pois são pagos para isso.
Enquanto
pensar livremente… Ainda não é alvo de lápis azul.